Paris, 29 de dezembro de 1891

Minha querida tia,

Devo pedir-lhe mil desculpas por meu atraso. Acredite, foi devido ao estado de tristeza e ao repouso no qual me encontro desde a catástrofe do dia 5 deste mês.

Faço questão também de agradecer-lhe de todo o coração essas novas demonstrações de afeto quase maternais.

Minha carta parecerá talvez insuficiente para exprimir todos os meus sentimentos. Por favor aceite-a como ela é, na minha sinceridade sem palavras.

Saí de Viena no dia 30 de novembro após ter recebido uma correspondência anunciando que o imperador se debilitava à vista d’olhos.

Quando cheguei em Paris, no dia 1º à noite, o imperador deitado me pareceu relativamente bem. No dia seguinte, seu aniversário, ele passou muito bem e sua majestade conversava ainda relativamente animado. A doença começou a se agravar pela noite do dia 4 (febre de 39º, falta de ar).

No dia 4, por volta do meio-dia, a febre subiu de repente para 41º e a pneumonia atingiu também o outro pulmão. Desde então, os médicos perderam toda a esperança. Às 4 horas, o imperador perdeu a consciência e após uma longa luta, deu o último suspiro à meia-noite e meia (de 4 para 5 de dezembro) tendo recebido todos os sacramentos da igreja, e cercado pelo tio G.,[1] tia Isabel, por mim e outras pessoas da sua casa.

Gusty[2] estava bastante doente em Viena e não pôde vir. Ele está melhor, mas ainda não está saindo, pois foi acometido de uma forte angina. Imediatamente após o falecimento de sua majestade, todas as formalidades foram cumpridas pelos oficiais de sua casa e recobriram o corpo com a bandeira imperial. O que foi muito bom.

Vinte e quatro horas depois, foi feito o embalsamamento e o imperador foi colocado na capela ardente vestido de general-chefe, com todas as suas condecorações brasileiras. Grande afluência de pessoas para vê-lo e inscrever-se nos registros.

No dia 8 à noite, o corpo foi transportado para a Madeleine e, no dia 9 às 11 horas, foi celebrada a cerimônia solene à qual o senhor d’Ébart assistiu imediatamente ao lado do corpo diplomático. Aproveito o parêntese para agradecer de novo ao tio por essa atenção e acrescentarei que agora, mais do que nunca, espero também seu apoio quando a ocasião se apresentar. O funeral, se foi bem-sucedido, deve-se ao barão de Estrela, que se superou.

Será que minha tia não poderia obter do tio que ele passe de comandante de 1ª classe da Ernestine para comandante da Grã-Cruz?

Meu pedido seria inconveniente?

Após a cerimônia, o corpo foi conduzido para a Estação de Orleans com todas as honras reais por ordem do governo francês e, às 8 horas, um trem especial partiu para Irun. Durante todo o nosso trajeto na Espanha, todas as honras reais foram prestadas e na estação de Madri todas as autoridades se achavam reunidas.

Em Lisboa, também, tudo se passou muito bem.

Na volta, paramos em Madri, onde a rainha Regente foi muito amável.

O mais triste é pensar que o imperador morreu no exílio e meu coração está cheio de tristeza. Em seus últimos momentos, pude compreender ainda melhor do que antes a grandeza de sua alma. Depois dele, não virá ninguém que a ele possa ser comparado. Apesar do seu desaparecimento, parece-me que ele ainda permanece perto de mim no meu pensamento e isso me consola, me fortifica e me dá esperança para o futuro.

Diga, por favor, mil coisas e amizade ao tio e creia-me

Seu muito respeitoso e devotado sobrinho

Pedro

P.S.: Meus melhores votos para o dia de ano.

Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Rio de Janeiro: Departamento de Imprensa Nacional, v. 238, jan.-mar., 1958, pp. 447-449.

[1] N.S.: Gastão de Orleans (1842-1922), Conde d’Eu, marido da princesa Isabel, filha de dom Pedro II.
[2] N.S.: Apelido que a princesa Leopoldina, filha de dom Pedro II e mãe de Pedro Augusto, deu a seu marido, Luís Augusto de Saxe-Coburgo e Gotha (1845-1907).