Sevilha, 7 de abril de 1957

Meu caro Decio,

Recebi sua última carta. Está tudo ok – tudo o que você diz a respeito de pagamento, datas de publicação, etc. Não se preocupe que não me prejudica em nada deixar os poemas inéditos mais tempo.

O que você me pede a respeito da nota é que está difícil. Devo dizer que sua ideia de umas crônicas sobre a Espanha me tentou bastante. Ela me chegou quando andava meio cansado depois de semanas de luta para “cuadrar o círculo”, que é para mim escrever a poesia que estou escrevendo agora.[1] Cansado, isto é, pronto a me entregar a qualquer coisa menos rígida que a poesia. Crônicas, por exemplo. Mas devo dizer a você que resisti – apesar da simpática oportunidade que essa colaboração me brindaria de estreitar relações com o Estado. Fazer prosa de ideias, críticas, enfim, falar de coisas, seria jogar pela janela minha paz atual. E fazer as crônicas meio impressionistas que você sugere seria no momento atual, para mim, uma espécie de covardia, não sei bem explicar. Você me desculpe. Mas sinto que iria prejudicar certas coisas de poesia que estou fazendo e que preciso fazer; seria romper um mood que me está levando a fazer um estilo de coisas que não sinto ainda esgotado.

Desculpe a complicação. Mas obrigado pelo seu convite. Um abraço do

João Cabral

P.S.: Aguardo os suplementos aéreos.

Arquivo Decio de Almeida Prado / Acervo IMS.

[1] N.S.: Referência a Quaderna, publicado em 1960 em Lisboa.